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Manejo do Guillain-Barré

 

Dicas no Manejo da Síndrome de Guillain-Barré

Julio A. Chalela - Seminars in Neurology  2001; 399-406.

Tradução e adaptação: Dr. Diogo Fraxino de Almeida                                   

► Pacientes com Guillain-Barré (GB) podem necessitar cuidados intensivos por várias razões, entretanto, a mais comum é a insuficiência respiratória. Outras causas são instabilidade autonômica, infecções secundárias, trombose venosa profunda, embolia pulmonar e complicações do tratamento com imunoglobulina (anafilaxia, meningite asséptica, insuficiência renal aguda, insuficiência cardíaca e tromboembolismo) ou plasmaferese (pneumotórax, coagulopatia e hipocalcemia).

► A disfunção respiratória pode variar de discreta dispnéia até falência respiratória severa. Para uma ventilação adequada os pacientes precisam de bom esforço inspiratório e expiratório, além de capacidade de proteger as vias aéreas.

► Assim, diferentes mecanismos podem provocar insuficiência respiratória em GB. Pacientes com fraqueza bulbar severa necessitam entubação, mesmo que a capacidade vital e as trocas gasosas estejam relativamente normais.

► Os médicos não podem esquecer que a intensidade da fraqueza nos músculos respiratórios de pacientes com GB não é uniforme e que a força dos músculos dos membros não se correlaciona efetivamente com a força do diafragma.

► Os sinais clínicos que devem indicar a necessidade de UTI nos pacientes com GB são:

  • Dispnéia
  • Aumento da freqüência respiratória
  • Alteração do nível de consciência
  • Incapacidade de contar até 20 em apenas um esforço respiratório
  • Sudorese facial
  • Respiração paradoxal
  • Incapacidade de levantar a cabeça da cama
  • Fraqueza no ombro
  • Fraqueza orolingual
  • Sinais de fraqueza bulbar (voz nasal, diminuição dos movimentos do palato, desaparecimento do reflexo do vômito).

► Algumas provas pulmonares podem ser usadas à beira do leito para avaliação dos pacientes com GB. A capacidade vital é o parâmetro mais utilizado e a maioria dos especialistas considera valores menores que 15 mlIKg indicativos de entubação. Entretanto, algumas vezes pacientes com capacidades vitais superiores a 15 mlIKg podem ter dificuldade de tossir ou atelectasias e eventualmente necessitam ser entubados. Mais do que valores absolutos, a queda rápida da capacidade vital é um parâmetro mais importante de gravidade. Quedas de mais que 50% em menos de 48 horas são particularmente preocupantes. 

► A capacidade inspiratória máxima abaixo de 25 cm/H20 é preocupante, independente da capacidade vital. A capacidade expiratória máxima também pode ser um método mais sensível que a capacidade vital para a determinação da gravidade do comprometimento respiratório. Níveis abaixo de 40 cm/H20 são particularmente perigosos.

►Os pacientes com GB devem ser entubados ante a menor evidência de insuficiência respiratória. A entubação em pacientes com GB é mais difícil que em pacientes com outras doenças neuromusculares por causa da disautonomia e da tendência de hipercalemia letal quando o relaxante succinilcolina é utilizado. Bradiarritmias e hipotensão são comuns nesses pacientes durante a manipulação da via aérea.

► Pacientes com GB são susceptíveis à paralisias de nervos periféricos por compressão externa, provavelmente devido ao processo inflamatório dos mesmos. Queda do pé por compressão do nervo fibular é comum após a recuperação do déficit ocasionado pelo GB. Proteção dos locais susceptíveis de compressão com almofadas é uma medida simples e útil para evitar essas compressões. A chamada posição de perna de sapo (pernas abertas com joelhos dobrados, cotovelos parcialmente flexionados e apoiados em almofada, ombros extendidos) é útil para evitar compressões e bem tolerada pelos pacientes.

► Decúbito lateral com colocação de almofadas protetoras também é útil para prevenir compressões e aspiração pulmonar. Troca de decúbito a cada 2 horas é importante para evitar escaras de pressão. Entretanto, a manipulação dos pacientes deve ser gentil, pois pode provocar dores muito intensas. Esse é um aspecto extremamente importante de ser observado, principalmente porque muitos pacientes não podem se comunicar devido ao tubo orotraqueal ou traqueostomia.

► GB severo é um estado catabólico (tão importante como na sepsis e no trauma severo) e necessita de suporte nutricional adequado precocemente para evitar desnutrição, hipoalbuminemia, aumento da incidência de úlceras de decúbito e infecções. Dietas com alta caloria (40 a 45 calorias não proteicas/dia) e ricas em proteínas (2 a 2,5 g/kg) por via enteral contínua devem ser introduzidas. Contra-indicações à alimentação enteral são vômitos intensos, íleo, obstrução intestinal e hipotensão (devido ao risco de isquemia intestinal). Nesses casos deve-se usar nutrição parenteral total.

►Disfunção gastrointestinal é freqüente, incluindo gastrite erosiva, úlcera de stress, retardo do esvaziamento gástrico, constipação, íleo e mesmo perfuração intestinal. O uso de um bloqueador H2 ou de omeprazol deveria ser considerado em todos os pacientes de alto risco ou que não estejam recebendo nutrição enteral. O uso de narcóticos para a dor pode piorar a constipação. Metoclopramida é usada para acelerar o esvaziamento gástrico. Dieta rica em fibras, grande quantidade de líquidos e substancias para amolecer as fezes são medidas importantes para evitar impactação fecal.

► Síndromes dolorosas são comuns em pacientes com GB e mais de um tipo de dor pode ocorrer em um único paciente. Os médicos não costumam perguntar aos pacientes entubados com GB se eles estão com dor. A dor mais comum é semelhante àquela que temos após exercícios físicos intensos, ou seja, uma dor muscular generalizada, mais intensa nas costas, nádegas, coxas e panturrilhas. Muitas vezes essa dor faz os médicos acharem que alguma miopatia é a causa do déficit motor do paciente. Compressas quentes, antiinflamatórios não-esteróides e morfina podem ser utilizados para aliviar a dor. Algumas vezes uma dose única de corticosteróide EV alivia a dor.

► Dor neuropática é a segunda síndrome dolorosa mais freqüente em GB, principalmente nos membros inferiores. Ocorre mais freqüentemente no período prodrômico e após a recuperação. Antidepressivos tricíclicos são as drogas de escolha, exceto nos pacientes com disautonomia importante. Alternativa aos tricíclicos seria a carbamazepina, ácido valpróico e gabapentina.

► Dor articular é menos freqüente e responde à antiinflamatórios e bolsas de gelo.

► Disfunção autonômica é extremamente freqüente em GB, entretanto geralmente é benigna e não necessita tratamento específico. Entretanto, é prudente acompanhar esses pacientes em UTI.

► Hipertensão paroxística é o sintoma autonômico mais comum. Algumas vezes ela simula feocromocitoma. Algumas complicações das crises hipertensivas incluem edema pulmonar, encefalopatia hipertensiva e hemorragia intracraniana. As crises hipertensivas somente devem ser tratadas se houver evidência de lesão a órgãos-alvo. Agentes de curta duração como nitroprussiato são preferíveis.

► Hipotensão ocorre mais em pacientes tratraparéticos, com envolvimento bulbar e falência respiratória. Geralmente está associada com discreta bradicardia. Pode ser desencadeada por aspiração traqueal e mobilização do paciente. Somente deve ser tratada se houver hipoperfusão sistêmica. Algumas medidas podem ser tomadas para diminuir sua incidência como elevação da cabeceira, uso de meias elásticas compressivas, cristalóides endovenosos e uso de AINE.

►As arritmias cardíacas são as complicações autonômicas mais graves do GB. Tanto bradiarritmias (bradicardia, bloqueio, assistolia) como taquiarritmia (taquicardia sinusal, fibrilação atrial, flutter atrial e taquicardia ventricular).

► Outras manifestações autonômicas são retenção urinária, íleo paralítico, edema pulmonar neurogênico, alterações da sudorese e temperatura, síndrome da secreção inapropriada de hormônio antidiurético e disfunção da musculatura lisa brônquica. A retenção urinária é tratada com cateterização intermitente. A síndrome da secreção inapropriada do hormônio antidiurético é melhor tratada com restrição de fluidos e tabletes de sal.

► A imunoglobulina é mais segura que a plasmaferese por não envolver a colocação de cateter venoso central e não apresentar risco de pneumotórax e infecções relacionadas ao cateter.

► As principais complicações da imunoglobulina são anafilaxia (nos pacientes com deficiência de IgA), insuficiência renal aguda, edema pulmonar cardiogênico, meningite asséptica, hiperglicemia, e complicações trombóticas relacionadas à hipercoaguabilidade transitória.

► As principais complicações da plasmaferese são pneumotórax, sépsis, hipocalcemia, coagulopatias e hipotensão. A plasmaferese deve ser evitada em pacientes com instabilidade autonômica acentuada. O uso de uma veia calibrosa no braço pode evitar a obtenção de via central e suas complicações.

► Não esqueça de tranqüilizar o paciente quanto à segurança do sistema de respiração artificial, pois muitas vezes os pacientes ficam em pânico de o aparelho parar de funcionar e ninguém perceber. Lembre-se que os pacientes não sabem que existem sistemas de alarme.

► O momento de realizar a traqueostomia é uma decisão difícil em pacientes com GB. Ela deve ser realizada em todos os pacientes que permanecem entubados por mais de 3 semanas. Entretanto, se houver estimativa de tempo prolongado de UTI, a traqueostomia pode ser realizada mais precocemente. Isso é particularmente verdadeiro nos pacientes com a forma axonal da doença, de pior prognóstico.

► O prognóstico de pacientes com GB é favorável na maioria dos casos. A mortalidade varia de 2 a 12 % e incapacidade permanente ocorre em aproximadamente 15%. Os fatores relacionados com pior prognóstico são idade avançada, amplitude do potencial de ação muscular composto muito baixa na condução nervosa (indicando dano axonal significativo), necessidade de suporte ventilatório e progressão rápida dos sintomas. Alguns fatores epidemiológicos de mau prognostico são diarréia antecedente, infecção por citomegalovírus e Campilobacter jejuni. A presença de anticorpos contra os gangliosídeos GM1 (associados com a forma axonal) e a elevação da enolase neurônio-específica no líquor também indicam mau prognóstico.

 

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